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Entrevistas / Leituras

Big Jesi e o #30dias30beats

Você possivelmente já ouviu falar de algum dos desafios mensais da internet. Pra quem desenha tem o Inktober, o She Shreds faz o #1RAD (1 riff a day), onde participam mulheres e pessoas não binarias tocando guitarra ou baixo e tem também o #30dias30beats, cujo nome é autoexplicativo.

A ideia do #30dias30beats foi impulsionada por Daniel Jesi, músico e produtor de João Pessoa. Esse ano ele terá sua quarta edição.

Conversamos com ele sobre o desafio, seu novo disco e muito mais.

Pra começar, você pode falar um pouco sobre a sua trajetória na música?

Comecei na música com a banda instrumental Burro Morto, que tem influências de afrobeat. No cenário de rock progressivo havia um grupo de bandas e esse grupo formou um estúdio, Mutuca, e esse estúdio acabou abrigando vários artistas renomados.

Depois da Burro Morto comecei produzir as minhas músicas na intenção de mostrar pra outras pessoas e formar uma nova banda, e enquanto isso eu tocava com outros artistas.

Eu não me via como produtor, apenas músico, mas o ambiente do estúdio te força a ser um pouco produtor. Muitas vezes você tá gravando uma pessoa e o artista tá sem ninguém pra dar um feedback, porque essa figura do produtor musical geralmente aparece quando há um financiamento, quando há algo voltado para o mercado, e lá gravávamos muitas bandas novas. Eles perguntavam “Você acha que essa guitarra tá massa?”. Comecei a virar produtor por causa disso.

O Mutuca virou exclusivamente um estúdio de gravação e eu queria um estúdio de criação, um lugar onde eu pudesse errar, não temos essa possibilidade num estúdio de gravação.

Nessa época conheci Mari Oliveira, que me apresentou o slam aqui de João Pessoa. Comecei a frequentar os slams e conheci Filosofino, Bixarte e outras pessoas que faziam hip hop na cidade, que era algo que eu não tinha tanto acesso. E nisso, junto com Riegulate, criamos o BBS com a intenção de entender o que a cidade tinha e como podíamos colaborar com isso.

Junto com Bravo, formamos um núcleo de ideias “Vamos produzir do jeito que der. Tenho um computador e uma mesa em casa, chama Filosofino pra gravar e lançamos mês que vem”. E essa ideia foi o pré #30dias30beats: o que eu tiver, tenho que lançar. Se eu tiver só um computador, gravo com auxilio do celular. Fizemos isso, junto com shows, pra movimentar a criação local.

O que é o #30dias30beats? E como ele surgiu?

A ideia é experimentação, criação, exercício, mostrar uma coisa crua e o Instagram era a plataforma pra isso na época. Ele tem dois lados: o cru, como as lives, e o mais produzido, que te dá um gancho pra te levar pro Youtube, pro Spotify. Acho que hoje o TikTok leva pra um outro caminho.

O movimento #30dias30beats era um grupo no Whatsapp que foi crescendo com a disseminação da hashtag. As regras foram surgindo quando mais pessoas chegavam. Surgiam dúvidas e então delimitamos uma lista de sugestões, na verdade não são regras: a faixa tem que ter pelo menos um minuto, o video também, tem que postar um por dia e etc.

No terceiro ano (2021) houveram algumas frustrações, pois conseguimos produzir facilmente, mas somos ludibriados por não entender como funciona a parte da finalização da coisa, o lançamento. Eu tenho dois discos engatilhados, que foi o material que produzi durante os dois últimos #30dias30beats.

O seu disco, “Kroutons”, foi produzido durante o desafio, certo?

Todo meu primeiro disco saiu do primeiro #30dias30beats, começou com músicas de um minuto, pois é o limite de duração de videos do Instagram, mas como os streams não aceitaram 30 faixas com um minuto cada, tive que reformular, mesclando faixas.

O disco teve a participação do Diego do Hominis Canidade, ele fez uma playlist com as 30 faixas e dessa playlist eu mesclei elas. Há alguns cortes bem verticais mesmo, uma música pra outra na mesma faixa.

Vocês fizeram uma coletânea com algumas das músicas produzidas durante uma das temporadas, não?

A coletânea “mvmnt vol.1” surgiu dentro do #30dias30beats. O pessoal sentiu a necessidade de ter um selo desvinculado à hashtag, e daí surgiu o 30DB.

Fizemos a primeira coletânea e foi legal, teve um feedback bom, mas percebemos que nós temos uma grande dificuldade com a conclusão da música, masterização, lançamento.

Era um grupo com 170 pessoas e somente 14 mandaram uma música pronta pra coletânea, aí você começa a perceber que existe um gap que não é sobre a criatividade, algumas pessoas veem esse passo da finalização, da produção, como algo que não é artístico.

É sim, mais burocrático, mas temos que aprender a fazer essa parte também, no final muita gente deixa de ser conhecida só porque não colocou sua música nos streams. Não que eu apoie os streams, mas hoje é uma necessidade. Onde tá minha comunidade? Eles usam o Spotify? Então tenho que estar lá.

Lançamos ela, mas não teve força pra um segundo ato, eu não pude monitorar e também não houve ninguém no grupo que tinha essa disponibilidade, era algo muito trabalhoso, tinha muita gente envolvida.

Últimas considerações? Algum recado?

Se ligar pra fazer parcerias na cidade, fortificar a própria base é muito importante. Se tem um artista do seu lado que não consegue se sustentar, e você tem capacidade disso, se junta com essa galera, pois a possibilidade de criar algo novo é maior e as pessoas que acompanham artistas conhecidos também querem coisas novas. Pensar menos e fazer mais.


Meu primeiro contato com o #30dias30beats foi em 2021, quando vi Cada Dia Outra Música compartilhando um chamado. Fiquei curiose e fui ver do que se tratava. Achei interessantíssimo e resolvi participar, já que durante a pandemia eu aprendi a fazer beats.

Resultado: comecei o mês com um celular e terminei ele com um controlador midi. Foi intenso. Entre criar uma faixa e postar ela no Instagram há um longo caminho de aprendizagem, que é as vezes chato, mas não é difícil.

Viva a era lo-fi! Hoje é possível fazer música sem precisar de muito dinheiro pra equipamento, e melhor ainda, com equipamentos que são um tanto fáceis de usar, como um celular (todo mundo tem) e um computador.

A cada dia os gêneros musicais se mesclam mais e tudo vira arte, muitas vezes fica difícil rotular, e os beats (aquela base eletrônica de percussão, mas nem sempre só) a gente já vê em todo lugar hoje, inclusive no rock.

Convidamos todes a acompanharem o #30dias30beats (tanto na hashtag quanto no perfil), que começa 1 de abril, é muita energia criativa num lugar só.